Por Magno Martins
Truculento para uns, amado
e temido para outros, mas acima de tudo formidável articulador político, o
ex-deputado José Mendonça Bezerra (DEM) morreu em abril de 2011 sem
realizar um velho sonho: governar Belo Jardim, sua terra natal, onde mantinha
sua principal base eleitoral e negócios na área empresarial. Já conhecia esse
desejo de Mendonção, como assim o tratava, de há muito tempo.
Na verdade, desde que
deixou a Câmara dos Deputados em 2010, depois de oito mandatos consecutivos.
Entre um gole de vinho e uma garfada num pernil de carneiro, que adorava,
rodeado de amigos em seu apartamento de Brasília, sempre às quartas-feiras, ele
deixava brotar esse desejo, que estava, infinitamente, abaixo de outro: ver
Mendonça Filho, seu herdeiro político, eleito governador de Pernambuco.
Não realizou nenhum nem
outro. Mendoncinha(DEM), como é conhecido, chegou a disputar o Governo estadual
em 2006, apoiado por Jarbas Vasconcelos (PMDB), mas perdeu para Eduardo Campos
(PSB). A derrota foi o maior baque político e emocional que Mendonção carregou
até a morte.
Assisti, por diversas
vezes, o velho cacique chorar copiosamente, durante longos desabafos, como
também presenciei outro momento ímpar, muito emocionante de sua vida: a posse
de Mendoncinha, que governou o Estado por nove meses, substituindo Jarbas, de
quem foi vice por dois mandatos.
Tive brigas homéricas com
Mendonção, pavio curto na relação com jornalistas. Seu calo eram notas em minha
coluna que contrariavam Mendonça Filho. Mas ele não brigou apenas comigo.
Talvez o radialista Lúcio Vieira, que trabalhou por muito tempo na Rádio Clube,
lidere o ranking dos desencontros. Lembro-me ainda de Zadock Castelo Branco,
ex-DP, que quase apanha fisicamente.
Numa sexta-feira de semana
pré-carnavalesca, não sei a título de que, noticiei algo, certamente com
Mendoncinha, que enfureceu Mendonção. No final da tarde, toca o telefone na
redação da Folha de Pernambuco e do outro lado da linha ouço um político e pai,
ao mesmo tempo, totalmente descontrolado, fazendo duras ameaças a mim. “Comprei
duas mesas para o baile do Siri hoje, mas não vou mais para não encontrá-lo lá
e quebrar a sua cara”, ameaçou.
Mendonção era assim. Mas
sua ira era passageira, de poucos momentos. Depois, se arrependia. Recorria a
amigos em comum em busca da reconciliação ou ele próprio, humildemente, pedia
desculpas. Nunca conheci, entretanto, um político tão bem informado, uma fonte
imprescindível para qualquer jornalista. Nosso último encontro, que não me
pareceu como despedida, se deu um mês antes da sua internação.
Almoçamos no restaurante
Bargaço, Zona Sul do Recife, e lá me revelou que estava fazendo exames e após o
checkup iria se voltar para Belo Jardim. “Quero encerrar minha trajetória como
prefeito de minha terra”, reiterou. Dois meses após, veio a notícia da sua
morte. Fiquei matutando a frase nos funerais em Belo Jardim. Sua amada cidade
parou para lhe dar o último adeus, saudosa do líder e filho amado.
Por lá encontrei até o
ex-deputado Cintra Galvão, com quem Mendonção brigou a vida inteira pelo
monopólio político do município. A habilidade do ex-deputado ficou famosa no
Estado quando construiu a candidatura de Jarbas a governador pela chamada União
por Pernambuco. O carimbo da aliança saiu durante um histórico churrasco em sua
fazenda entre Belo Jardim e São Bento do Una.
Mendonção chegou na Câmara
dos Deputados em 1979, em pleno processo de abertura. Em 1994, demonstrou força
eleitoral ao lançar-se candidato à reeleição, ao mesmo tempo em que lançou
Mendonça Filho para deputado federal. Os dois se elegeram. Neste mesmo ano,
idealizou de uma articulação política que mudaria a história política de
Pernambuco, ao unir PFL e PMDB, então adversários históricos.
Por causa disso, ficou
conhecido como o pai da aliança União por Pernambuco que, quatro anos depois,
conseguiria eleger Jarbas Vasconcelos governador, derrotando Miguel Arraes.
Mendonção nunca mudou de lado, esteve sempre na direita e assumido. Começou na
Arena, na época da ditadura, com o primeiro mandato de deputado estadual, em
1966. Ao longo da vida pública, só mudou de partido uma vez, saindo do PDS para
o PFL, uma dissidência da antiga legenda favorável à eleição indireta de
Tancredo Neves.
Foi um dos mais fiéis
escudeiros do Governo Jarbas e o pivô de várias polêmicas com o ex-senador
Sérgio Guerra (PSDB). Pelo amor ao filho e preocupado com o seu futuro bateu
menos do que pretendia em Guerra. Só se referia ao desafeto de Severino.
Guerra, na verdade, tinha o Severino antes do Estelita Guerra, mas escondia.
Entre os políticos,
Mendonção sempre foi conhecido por rompantes, mas por sua hábil facilidade de arquivar
divergências. Sua vida pública, de 44 anos, terminou com um discurso de sete
páginas, no plenário da Câmara dos Deputados. Em seu último pronunciamento como
parlamentar, ressaltou um aspecto raro na política atual: a importância de se
ter um lado e saiu da cena política dizendo-se orgulhoso. “Sei o tempo de
chegar e partir”, destacou.
A “Baraúna do Agreste”,
nome de batismo que ganhou logo após a primeira surra eleitoral em Cintra
Galvão na sua terra natal, faleceu, por ironia do destino, num domingo de
Páscoa, exatamente no dia 24 de abril de 2011, aos 75 anos, de infecção
generalizada.
Fonte: Blog Magno Martins
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